segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Voltando

Preparando a mente para voltar...

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Era Pilates

Era sempre assim. Colocava uma coisa na cabeça e não desistia até conseguir realizá-la. Foi assim também com a inscrição que fez na academia de ginástica. Não sossegou enquanto não fechou seu pacote anual com aulas de bike, natação, capoeira, musculação, tortura chinesa e pilates. Bastou assinar os cheques e chegar em casa para se arrepender de ter tido seu súbito de vida saudável e ativa.
Após duas semanas de encorajamento em doses homeopáticas e compras de maiô, toucas e calças que apertavam até o pensamento, dirigiu-se arrastada até a academia com a intenção de fazer valer os reais que “investiu” na mensalidade.
Pilates foi a opção mais aventureira que podia escolher.
Já ouvira falar da tal modalidade avançada e tonificante, mas sem grandes descrições e definições. Gostou do nome diferentinho e assim se juntou aos alunos da sala dois, no final da escada à direita.
Como era seu primeiro contato com a prática desconhecida, resolveu agir como os outros e, numa imitação desengonçada, agarrou uma tal bola gigantesca num braço e um tatame azul em outro e arrastou até o final da sala. Pelos aparatos necessários, pela luz apagada e até mesmo pela música de filme com final infeliz, logo percebera que a escolha havia sido uma furada. Um arrependimento amargo bateu.
Uma voz de lá da frente da sala com espelhos ecoou: “Posição de relaxamento!”. Que raios seria essa posição!? Gostou da palavra “relaxamento”. Qualquer que fosse a posição, relaxar é sempre bom... Olhou para o lado e imitou a maioria.
Deitada de costas no tatame azulão e com as pernas jogadas em cima da bola extragrande começou a gostar do assunto. Resolveu prestar atenção e ouviu outra instrução: “Ativem seus abdomens...”... Hum!?!? Ativar?
“Inspire... Expire... Inspire em três e Expire em seis... em quatro por oito... Ative o abdômen...”
Enquanto a música tocava calma, instruções vinham de todos os cantos da sala e, além do esforço físico, respiratório, mental, matemático e mimético, ainda tinha o esforço didático das aulas de anatomia que perdera na oitava série.
“Abracem a Tíbia e levem-na até o Perônio... Inspire, expire, ative o abdômen... olha a bola”... Cadê a Tíbia? Por um momento pensou em abraçar a aluna do tatame ao lado, mas achou um pouco pessoal demais para uma aula aparentemente tão individualizada. Opa! Mudou o movimento.
“Inspiração pelo nariz, expande a caixa torácica na porção lateral de posterior e expira pela boca, fechando a caixa torácica e projetando as últimas vértebras em direção à pélvis. Agora alterem a angulação “Q” do tendão do quadríceps femoral, alonguem o ligamento patelar e conduzam o movimento num “C” curto da espinha ilíaca ântero-superior contando as 32 vertebrinhas... Intensificando a pressão... Vamos lá! Inspire... Expire... Ativem...”
Resolveu começar a hidroginástica na semana que vem, quando seus músculos, com sorte, estarão menos doloridos.

terça-feira, 24 de agosto de 2010

Paixões

Estava eu, parado no mesmo lugar, aguardando ansioso para encontrar o meu amor. Já fazia alguns dias que as aulas haviam começado e ela ainda não aparecera até então.
Geralmente, logo nos primeiros dias de aula, eu já sabia quem seria a minha louca paixão para aquele ano letivo.
Não que eu fosse dado a paixões efêmeras ou insignificantes, aliás, muito pelo contrário. Costumava me dedicar fielmente aos meus romances colegiais, que ora me rendiam boas notas e ora me rendiam dores profundas. Na quinta série não seria diferente. Era a minha sina.
Nessa espera aflita, enquanto devorava meu lanche em meio aos meninos da sexta e sétima série, comecei a me lembrar das minhas paixões recém antigas.
Acho que foi na quarta série que descobri minha queda por mulheres mais velhas. Era Ana Lúcia o seu nome. E que lindo nome! Combinava com seus olhos amendoados que ficavam atrás de um óculos de grau fraco.
Ela chegava todos os dias pontualmente às sete e quinze na sala de aula, abria seu livro encapado, dava uma olhada rápida por cima da cabeça dos alunos e fazia a chamada. Chamava nome a nome.
Embora eu fosse um dos últimos da lista, ainda tinha a sorte (ou o azar) de ter mais dois alunos com o mesmo nome. Assim podia ouví-la pronunciar meu nome por três vezes seguidas. Soava como melodia aos meus ouvidos. Muitas das vezes, fingia estar distraído, só pra ouví-la chamar por mim lá da frente da sala. Por causa disso, minha mãe foi chamada à escola para falar sobre o meu pequeno déficit de atenção que eu, desatento, preferia chamar de amor.
Na terceira série, já no primeiro dia de aula, pude reconhecê-la dos meus sonhos. Ela era linda, meiga e, se é possível dizer, aos 8 anos já se mostrava uma fêmea atraente. Tinha os cabelos cacheados, olhos arredondados, mãos miúdas e unhas sempre aparadas. Era caprichosa e vaidosa. Suas canetas levavam seu nome e eram tantas as cores, que seu caderno parecia um arco-íris despontando no céu azul... desses que saem para ver o dia após uma forte chuva de verão.
A aproximação foi fácil, já que eu tinha dificuldades com matemática e ela era a melhor da classe... Difícil foi o fim do nosso relacionamento que se findou quando um garoto brutamontes da quinta série resolveu aparecer nos intervalos do primário para dilacerar meu coração.
Já na segunda série estive completamente louco por... Como era mesmo o nome dela?

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Idéias

Um dia um sábio moderno (que provavelmente era bem sucedido) disse:

“Dinheiro não cria idéias. Idéias é que criam dinheiro.”

Foi então que percebi que ando sem idéias.
:-S

segunda-feira, 28 de junho de 2010

Na espera

Foi no anúncio da sua espera que o rútilo dos meus olhos mudou de cor. No lume de um palpitar vazio e sem compasso a curva do meu rosto se umedeceu. Lúbrica, na vértice de sorver pelo chão, uma gota foi amparada por um lábio que decifrava os significados do tempo.
Esperava eu, na ânsia de uma vinda falsa, suas botas no meu capacho. Ainda que deixadas do lado de fora, ainda que sujas ou velhas ainda esperava eu por um voltar sem volta . Na promessa declamada num dia cinza, guardava no frio das mais altas ameias um coração aflito que, paciente, aguardava por esperar.
Na esperança da espera, notei que vivera até aqui gozando de meus dias como se eles fossem infindos, como se o calendário, agora desbotado e com orelhas, marcasse sempre o primeiro dia de cada mês e os meses que surgem são sempre meses sem feriados.
Foi por esperar demais que aprendi que os dias devem ser vividos como se fossem os últimos da folhinha, que os amores devem ser amados como se amanhã não houvesse paz, que os sorrisos devem ser dados como se fossem perder o som, que se deve tocar como se a mão perdesse o toque, como se a boca perdesse o tom...

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Caixa de Retalhos

Sentada no chão de pernas dobradas, vasculhava numa caixa antiga alguns papéis do passado. Procurava por um texto que um dia alguém lhe escreveu. Um texto bobo, comprido, romântico, doído. Um texto escrito em papel pautado, letra trabalhada, pintado com caneta que brilhava num verde pálido. Lembrava as cartas escritas nos séculos distantes para anunciar um acontecimento bom... parecia com as missivas que os amantes trocavam ilegais entre as vilas antigas que, mesmo sorrateiros, geravam guerras entre os brasões.
Revirou a caixa velha e já molenga e por lá encontrou coisas que lhe fizeram voltar há alguns tempos atrás... encontrou dentro do baú improvisado coisas boas, coisas inúteis, fotos borradas, cartas rasuradas, cartões de aniversário e de desejos de boa sorte.
Encontrou ali um pedaço pequeno de si. Um pedaço que ficara esquecido e, que abafado dentro da tal caixa, adormeceu num coma profundo. Releu alguns textos antigos, alguns anúncios que vendiam fantasias, outros que pediam socorro e pensou se era possível resgatar aquilo tudo. A caixa era pequena, mas o que guardava era grande demais para caber em outro lugar. Preferiu fechar a caixa e manter tudo ali... adormecido como estava. Deixou o tal texto bobo pra lá e preferiu buscá-lo na lembrança...

... “E é por isso que eu te peço: resta um pouco em minha vida
Que meus deuses estão mortos, minhas musas estão findas
E de ti eu só quisera fosses minha primavera
E só espero, Coisa Linda, dar-te muitas coisas lindas...”

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Tons de Verde

Sobrevoava a copa das árvores nas manhãs frias da cidade quente. O céu sempre estava claro, mas lá de cima punha-se a observar os tons de verde que ficavam aqui no chão.

Eram verdes claros, escuros, musgos, esmeraldas, desbotados, olivas. Verdes verdes, verdes maduros, bandeira e limão.

A vida seguia assim, aparentemente dentro da normalidade da paz que pairava no céu. Enquanto voava com o vento pensou que viver não é tom, nem dom...viver é sorte.

sexta-feira, 9 de abril de 2010

Saudade

Sentia que alguma coisa ali dentro estava diferente. Uma sensação de faltar ar, de faltar sim e faltar não, de faltar algum, faltar alguém, falta de nós.
Era como terço sem reza, vela acesa sem clarão ou anéis de metal sem os dedos da mão. Era lousa sem giz, adeus sem partida, quase viagem sem despedida.
Ali dentro era vazio, era eco, era vácuo, era escuro, era nada, era tudo... Assim como brasa sem cinza, anil sem cor, banho sem vapor e louca paixão sem ardor. Era giro sem mundo, poço sem fundo, canção em um segundo.
Naquele instante nada fazia sentido, faltavam sussurros ao pé do ouvido, poesia que fala de amor doído. Sentia-se como um livro sem fim, praia sem maresia ou flores secas num jardim. O tempo passava como um relógio sem ponteiro, missas de joelho, neblina e nevoeiro.
Fusco, põe-se a pensar e deu-se conta que chamava de saudade essa dor de não se ter metade, dia de sol que num instante vira tempestade, é abraço que não chega e deixa vontade.
É saudade. Assim, sem rima, sem fim se você insiste em ficar longe de mim.

domingo, 4 de abril de 2010

Festança

O dia amanheceu onde não anoitece jamais, o clarão de um sol ímpar despontou entre as folhas de laranjeira que perfumavam a brisa leve e doce daquela pequena vereda. De repente tudo despertou para a ocasião. Era dia de festa, dia de alegria, dia de laurear a princesa daquele reinado.
Como era de costume para anunciar grandes celebrações, rompeu-se o horizonte azul um som de trombetas tocadas por arcanjos e querubins. Fez-se do silêncio sereno música pro céu dançar.
Colheram flores, enfeitaram com laços e fitas, levantaram as arandelas e estenderam as toalhas de renda. Os doces foram para o fogo, as crianças para a ciranda e as fadas se espalharam pelo ar... brilhavam feito faíscas vindas de um coração apaixonado a resignar.
Na entrada do reino bordaram um faixa com seu nome e fizeram-lhe um bordão. Ela tinha a beleza no nome, nos olhos e no coração. Era tão bela que as flores se inspiravam nela para perfumar. As borboletas, cintilantes e anis voavam sobre seus cabelos lisos a pentear... Nos olhos um brilho intenso, uma luz sem fim... ah, aqueles olhos de deixar saudade, de fazer chorar...
A bela princesa que dançava sua festa pelo salão, rodava o vestido e descalça tocava o chão. Era dia de felicidade, de celebração. O céu inteiro parou para olhar aquela menina girar, que girando semeava bênçãos com as mãos. Mais um ano e o céu agradeceu por tamanha dádiva, por tão linda criação.

quarta-feira, 24 de março de 2010

Ali à frente

Aqui de onde o vento sopra, eu fico sentada a olhar pra frente. Daqui de onde eu me recosto pra pensar em mim, fico a observar as pessoas que vivem mais ali à frente e daqui eu vejo gente andando, gente resolvendo problemas, gente criando problemas. A vida ali na frente parece passar comum e apressada, num marasmo indiferente, numa rotação contínua. Quanto mais espio, mas tenho a impressão de que ali tudo é mesmice, tudo é nada, e nada é menos ainda, passa e ninguém vê.
As pessoas ali da frente medem o tempo em “check-list”... Cada um tem o seu, aliás, cada um tem sua lista infinda de coisas a fazer, cada qual com seu horário limite de resolução e, quando não são resolvidas a tempo, o dia tem horas a mais, as semanas tem dias e noites a mais e no final do mês tem olheiras a mais, cabelos a menos, doenças a mais, unhas a menos, gritos demais, respeito de menos...
Eu fico daqui a observar o mundo girar ali na frente e até confesso que às vezes fico zonza. O mundo ali gira rápido demais. Tão rápido que nem o vejo girar.
De longe eu sinto o vento soprar e de leve sinto a vida correr... Eu, que sentada aqui atrás deveria pensar em mim, fico só a olhar pra frente como quem espera a corda bater no chão pra começar a pular.